quinta-feira, 11 de junho de 2009

Claquete: Ninguém Sabe o Duro Que Dei

Neste domingo assisti ao filme do Simonal e saí do cinema muito satisfeito. A expectativa era grande, sentia que estava indo conferir um bom documentário e já conhecia algumas músicas - duas: Nem Vem Que Não Tem (que me apareceu nos créditos finais de Cidade de Deus) e Balanço Zona Sul (que conheci durante a campanha dos supermercados Zona Sul há dois anos). O que não sabia era que tinha sido ele, Simona, a criar a versão "picotada" de País Tropical. Cansei de ouvi-la na voz de Ben Jor e atribuí logo a Jorge, até porque é bem a sua cara.
Cláudio Manoel, Micael Langer e Calvito Leal fizeram um filme enxuto, emocionante e corretíssimo em sua construção. Tratava-se, afinal, de um trabalho de resgate: era preciso, antes de mais nada, contar a história de um cara cuja biografia é meio obscura até para quem viveu os 60 e 70. A montagem é muito bem sucedida pois marca claramente cada momento: o surgimento, a fama, o problema com o contador e o declínio. O trio conseguiu extrair trechos muito interessantes de entrevistados inspirados. Quando digo correto, me refiro não só à história muito bem contada, mas à iniciativa de dar voz ao outro lado, ao tal do contador, pivô de toda a infâmia. Os caras não se resumiram à narrativa saudosa, com músicas famosas e imagens de um passado feliz. Quando o contador é posto em cena, somos instigados a confrontar versões e isto nos inquieta.
Dá para se gastar horas falando a respeito da história contada na tela. Para começo de conversa, acredito no contador, o que não quer dizer que Simonal era um filho da puta. O que faltou a Simonal - e falta a um monte de brasileiros que poderiam ir mais longe com o talento que têm - foi profissionalismo. O que lhe sobrava era uma espécie de prepotência "defensiva": a banca, a marrentice, a arrogância, tudo isso me parece fruto de certo complexo de inferioridade: sou pobre, sou negro, filho de empregada doméstica, portanto se eu não me achar o máximo, ninguém vai achar. É exatamente esta a ideia que está presente na primeira cena do filme (veja o vídeo abaixo), quando ele diz "...Ou vai ser alguém na vida ou vai morrer crioulo mesmo". A banca pode tê-lo ajudado a criar o jeitão Simonal - irreverente, carismático -, que o fez estourar a boca do balão; mas também contribuiu para que ele extrapolasse os limites.
A falta de profissionalismo, por sua vez, fez com que ele não prosperasse financeiramente. Simonal ganhava e logo torrava. Teve contratos publicitários cancelados pela falta de seriedade. Com isso, a fonte foi secando. Se soubesse a hora de brincar - ou melhor, se fosse um marrento profissional, saberia usar isto para o seu bem, não iria à bancarrota, não precisaria demitir o tal do contador e a história seria outra.
Quanto à ideia de que ele era informante dos militares, fica claro para mim que é tudo uma grande besteira; mas é legal refletir sobre as causas que o jogaram na geladeira, principalmente a que se refere ao boicote da classe artística por ele não ser politizado o suficiente (o que queria significar não ser da esquerda o suficiente) ou por ele fazer a alegria das massas, "impedindo-as de ver" a repressão comendo solta. Enfim, grandes imbecilidades que a imprensa à época acabou comprando. Sobre isto eu destaco os depoimentos de Artur da Távola e do Boni, diretor global. O primeiro solta uma frase que vai ao encontro do que discuti aqui sobre o caso da brasileira que se auto-flagelou na Suíça. Ele diz, com outras palavras, que para a imprensa indício é fato, fato é julgamento e julgamento é condenação. Já Boni resume, direto: se Simonal fosse mesmo pró-ditadura, seria figurinha fácil na programação da Globo - o que não aconteceu.
Recomendo o filme. É um belo trabalho, melhor do que "Vinicius" e outros mais cotados. Não conhecia Carango, música cujo trecho dá nome ao documentário. Me amarrei. Já tá no iPod.

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